quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

QUINZE MINUTOS


Para Anair Rizzath.

“Você não é a vida, Sou muito menos complicada que ela.”
(José Saramago, As intermitências da morte)


A morte ficou cara a cara comigo:
Fragmentou-se em agulhas,
Picou-me,
Bebeu meu sangue
E me sorriu.
Eu também sorri-lhe.
Depois chorei discretamente.
Roí as unhas.
Tornei a sorrir.
Mas não me intimidei:
Fiz frente a ela,
Mostrando-lhe quem sou.
Acenou-me com a cabeça,
Negativamente,
E  disse-me, por fim:
– A sua vez de cair do andaime ainda não chegou.
Apertei-lhe a mão,
Ouvi seus conselhos,
Peguei meus papéis
E sair.
A vida cabe em cima de uma mesa:
Ela é bem menor do que o cotidiano supõe.


sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

SOBRE A MINHA CLASSIFICAÇÃO NO CONCURSO PÚBLICO Nº 08/2013-SAM 01


"O problema, Sr. Edvaldo, é que você é crítico, prepotente e negativista", estas foram as palavras que ouvi, uma vez, do coordenador do curso de Pedagogia de uma certa instituição privada na qual estudei. Eis o resultado, Sr. coordenador, das minhas críticas, do meu negativismo e da minha prepotência.
Ressalto, porém, que tal resultado não me faz melhor do que nenhum outro aluno desta ou de qualquer outra Instituição de Ensino Superior; muito menos indica que serei um bom professor e que saberei desempenhar minha "função" (lembrei-me do Durkheim) com mestria. No entanto, reflete, sem dúvida, tudo aquilo que aprendi com alguns professores em especial, tudo aquilo que aprendi muitas vezes estudando sozinho, muitas vezes estudando com a Cicera da Silva Pereira, com demais estudantes de Pedagogia e com os membros de nosso Grupo de Estudos, e outras vezes questionando e debatendo, SIM, com os demais professores (aqui me refiro aos "mediadores", "facilitadores" da aprendizagem, isto é, os "pseudoconstrutivistas").
Por fim, críticas negativistas à parte, agradeço a todos que contribuíram, de algum modo, para com este resultado, afinal, como diria Marx, "o concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações".




terça-feira, 21 de janeiro de 2014

TEQUILA, LIMÃO, CANELA E AÇÚCAR



Para Thauane Rocha e Carla Beatriz Campos.

Pense um pouco
Beba bastante
Depois me conte direito.
(Paulo Leminski)



Amiga, apesar da gente já ter conversado de tudo neste mundo, eu ainda fico meio sem jeito de perguntar certas coisas; não que estas sejam licenciosas tais como as putarias com as quais nos distraímos todos os dias, mas é que; não, na verdade não há nada de devasso nessas perguntas que quero fazer, mas é que, você sabe, o ser humano, mesmo tendo ciência de ser um ser fraco, não sabe encarar muito bem suas fraquezas, e acho que é isso, essas minhas perguntas revelam, até certo ponto, digo até certo ponto porque após ultrapassar essa fronteira, a do certo ponto, sei que elas evidenciam, em última instância, minha carência em alguma coisa, assim, como eu ia dizendo, essas minhas perguntas revelam algo de muito débil em mim; no entanto, como a garrafa de tequila já está abaixo da metade da metade, atrevo-me a compartilhar essas minhas perguntas com você, porque, no fundo, eu quero muito saber. Portanto, vou apagar a lâmpada da sala e deixar apenas a da varanda ligada, porque não quero que você me olhe enquanto eu estiver questionando; na verdade, você poderá me olhar, mas no escuro, porque no escuro seus olhos me olharão com os olhos de quem nada vê, ou pelo menos fingirão ver apenas o breu saindo de mim. E tem mais uma coisa: peço licença para deitar minha cabeça no seu colo e exijo que não mexa no meu cabelo, porque, enquanto eu estiver falando, quero seu corpo apenas como apoio, pois seu toque quebraria o seu papel de travesseiro que escuta, e então eu choraria muito e não saberia continuar. Antes de ficarmos no escuro, porém, também quero pedir para que não me interrompa, portanto só é para responder depois que eu ficar totalmente em silêncio, aí você desencarna o papel de travesseiro psicanalista e passa a ser você mesma, a menina doida que caiu da rede quando criança. Só mais outra coisa: antes de começar, proponho um brinde, só mais um shot de tequila com limão, açúcar e canela, pra ver se meu superego embebeda de vez e eu consigo finalmente perguntar tudo o que quero. Toma; aqui seu copo; um brinde a nós; e também ao Yudi e ao filho da puta do Zé que nos trocou por um orifício; e ao Marx, Stuart e Hegel; e também à pinguça da Aninha e à menina de black; por que você tá rindo? Vai, me fala! Por causa da menina de black? Eu também adoraria saber de onde ela tirou essa menina. Sabe, amiga, amanhã nem ela mesma vai acreditar que estava tendo visões; Gabi, você acredita em espíritos desencarnados? Há quem diga que essas coisas existem e que costumam aparecer para quem bebe muito, principalmente ela, que misturou tequila, cerveja, energético e uísque; não, tá doida? Pelo amor de deus, nada de Fenomenologia do Espírito agora! Eu também, tenho certeza que fico de exame em Filosofia; “se só o Absoluto é verdadeiro e se só o Verdadeiro é absoluto, isto é, se as partes são falsas e o Todo é verdadeiro, há verdade nas partes?”; eu não sei onde a gente tava com a cabeça que não respondeu “claro que há: a verdade está em você”; mas a gente pega ela na problematização do padeiro, aí eu quero ver ela me mostrar a verdade das partes; eu também, amiga, eu também; vou estudar tanto, mais tanto, que eu vou saber mais sobre luta de classes do que a ideologia alemã; vai, vamos beber; um, dois, a Ana acordou; aposto que vai perguntar mais uma vez se a mãe ligou; para de rir, garota do olho junto; deixa que eu vou lá, deixa, deixa; Gabriela, cadê o balde? Calma, Aninha, eu tô aqui; não, sua mãe não ligou, está tudo bem, nós lhe demos banho e você dormiu um pouco, foi isso o que aconteceu; não, você não é igual ao seu pai; que vergonha o quê, Ana! Somos seus amigos, você não está na casa de estranhos e está tudo bem; você quer água? Amiga, eu já te falei que a menina de black não existe, agora dorme que nós também já vamos dormir; não se preocupe, pois eu já limpei tudo, e não precisa pedir desculpa; a gente também tá doido para bater uma na cara, mas o negócio tá difícil, filha; isso, dorme, e qualquer coisa pode me chamar; Gabi, a Aninha vomitou só um pouquinho no seu quarto, o resto foi no balde mesmo; não, dessa vez ela não bebeu; está quase dormindo, deixei-a cantando o mantra da piroca com a xoxota; para de rir, garota mau caráter; o que diabo você fez com o bolo! Mas eu te falei pra não desinformá-lo quente, mas quem disse que você não me escuta; sem falar que caiu da rede quando bebê; vai, vamos virar logo o último shot, e apague a luz quando vier; você viu meu limão? Devo ter deixado no seu quarto; sim, mas não foi muito e amanhã eu limpo; traz outra banda de limão, amiga, sem açúcar; sim, com canela; deixa ele bem vermelho, como o batom daquela menina do bandejão; sim, bem ela; ei, eu te falei que a vi, esses dias, com um batom super roxo? Parecia que tinha bandejado salada de violeta; para de rir senão você derrama todo o shot; cuidado pra não pisar no notebook; vai, vamos virar; Como é mesmo a musiquinha? Sim, lembrei: arriba, abajo, al centro, adentro; Jesus, desceu rasgando tudo! Meu deus, a gente praticamente secou uma garrafa de tequila, tem noção? Vai, agora fique quieta que vou te contar, e não mexa no meu cabelo! É tão difícil perguntar isso; por favor, né, solta a porra do celular! Amanhã você conversa com o Yudi, o Bruno, o Igor, o garçom da Royal e a torcida do Palmeiras; está bem, do Flamengo; amanhã você conversa com o Emmanuel Yudi, o jogador de futebol que agora eu me esqueci do nome e a torcida do Mengão, mas preste atenção em mim, porra! Vai, agora é sério, chega de brincadeiras, pois o que eu tenho que perguntar é sério; não, não mexa no meu cabelo, tente ficar o mais distante de mim, mas deixe minha cabeça sobre suas coxas maravilhosas; sabia que todo homem quer te comer? Você é muito gostosa, Gabriela! Ei, finge que eu sou um objeto; não, para de rir, eu sei que não precisa fingir; faz o seguinte: invés de você ser um travesseiro com ouvidos, ponha-se no lugar de Freud ou Jung; melhor, finja que você é o Durkheim ou Radcliffe-Brown, e que agora estudará um indivíduo, que neste caso sou eu, e que você, cientista-positivista-conservadora-burguesa-capitalista, manter-se-á o mais longe do seu objeto de investigação; eu também adoro as mesóclises; agora é sério, sem mais enrolas: amiga, a pergunta é estranha, mas eu gostaria muito de saber o gosto de um beijo público; porque um beijo privado, entre quatro paredes, no sofá, no chão, na pia da cozinha, na cama, dentro do carro, debaixo do chuveiro, no corredor do quarto, eu sei, mas um beijo público, com pessoas olhando, tem gosto do quê? Aposto que não tem o mesmo sabor, porque o olhar em volta deve alterar alguma coisa, nem que seja a torcida da língua, a mão na nuca, o olho fechado, semifechado, aberto ou semiaberto. Não, eu disse que não é para você perguntar nada, lembra? Por enquanto é só pra escutar. Mas não, semifechado é bem diferente de semiaberto, assim como não-verdade é diferente de mentira; pois bem, como eu estava dizendo, que gosto tem um beijo vigiado? E o andar de mãos dadas, ao atravessar uma faixa de pedestres, qual a sensação? Sim, porque eu conheço o peso de uma mão dentro de um carro com vidros fumê, e também sei quanto pesa a mão dele quando estou sobre ele, isto é, quando nossas mãos ficam uma sobre a outra, presas, firmes, mas penso ser uma sensação totalmente diversa, totalmente diferente, o emaranhado dos dedos de uma mão que se entrecruzam com os dedos de uma outra mão ao descer uma escada rolante, por exemplo. E uma rosa vermelha, ganhada numa data especial, tem cheiro de quê?  Eu jamais disse isso a ninguém, e vou contar só a você e peço que guarde segredo: eu nunca recebi uma flor em toda minha vida e tenho maior vontade de tomá-la em minhas duas mãos, trazê-la próxima ao peito e cheirá-la levemente; mas tem que ser uma rosa, vermelha, bem vermelha, e tem que ser ganhada, senão não deve ter o mesmo perfume. Às vezes, quando escuto Exagerado, gosto de imaginar o Cazuza trazendo as suas mil rosas roubadas para mim. Amiga, mudando um pouco a pergunta, mas sem alterar o rumo da conversa, qual a sensação de ser apresentada aos amigos dele? Juro que passo noites, em claro, imaginando coisas do tipo: estamos, eu e ele, num barzinho tomando uma cerveja, o colega do trabalho ou amigo do cursinho aparece de repente, ele se levanta, puxa uma cadeira pro dito cujo, pede ao garçom mais um copo e diz: “este é meu namorado, é ele quem estuda tal curso, na universidade que te falei, bá-bá-bá-bi-bi-bi”, essas coisas, sabe? É sério, tenho muita vontade de saber como é se defrontar realmente com uma situação assim. Por fim, queria saber como é escutar “eu te amo” em frente à sogra, almoçar na casa da cunhada ou cunhado, brincar com os sobrinhos e assistir o Jornal Nacional ou São Paulo versus Corinthians com o pai do garotão; porque uma coisa é “eu te amo” quando estamos a sós, outra coisa é pedir uma pizza em casa, e outra, bem diferente, é assistir Café Filosófico ou Roda Viva na companhia dele. Parece que a Aninha acordou, me espera que já volto, prepare outro Shot, bem forte, com tequila e uísque, dessa vez com limão e sal, e pare de chorar, porque, apesar de tudo, o sol já tá nascendo outra vez e hoje já é um novo dia.


quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

A VOLTA PRA CASA


Estou dentro do ônibus. Atrás de mim há uma mulher cuja aparência física revela certa idade. Tal mulher carrega consigo uma sacola de latinhas. Volta e meia ela toma as últimas gotas de refrigerante que restaram do material recolhido. Na minha frente, mais especificamente no corredor do ônibus, um rapaz oferece gomas de mascar no sabor de hortelã e maracujá. A proprietária das latinhas, que está sentada logo atrás de mim, reza uma Ave Maria. O moço dos chicletes acabou de descer. Em pé, bem perto de mim, há um rapaz segurando um embrulho do McDonald’s. Também em pé encontra-se todo um rebanho de trabalhadores cansados. Agora entrou um pedinte no ônibus. Este não nos oferece nada, além de sua simpatia, como mercadoria. A mulher atrás de mim interrompeu sua ladainha e falou consigo mesma: “vai catar latinha!”. O moço, o pedinte, é negro, baixo e me lembra um pigmeu. O rapaz, que carrega próximo ao peito o embrulho do lanche fetichista, usa aparelho nos dentes e de vez em quando observa a minha mão correndo sobre o papel. O papel, em questão, é meu texto de antropologia do Radcliffe-Brown. Escrevo, por sinal, no verso da última folha. O pigmeu, pedinte, pede, a quem puder ajudá-lo, a quantia de dez centavos. A proprietária das latinhas, que agora entoa uma canção sobre mulheres, bebe um pouco d’água. O rapaz, de aparelho, que carrega encostado sobre seu peito o embrulho do tal lanche, veste uma camisa rosa que o deixa ainda mais atraente. Este também possui uma barba, de quatro a cinco dias, que lhe confere uma melhor aparência. Ao meu lado direito, uma moça, de uns vinte e poucos anos, lê um best-seller sobre anjos e vampiros. O pigmeu está prestes a descer, mas não sem antes eu e a leitora do meu lado lhe der duas moedas de cinquenta centavos. A mulher atrás de mim, a catadora de latinhas, canta agora uma canção sertaneja, sobre uma madrugada que passou e não volta mais. O ônibus agora está mais cheio. Lá na frente, bem lá na frente, uma criança começou a vomitar. Alguém, pra variar, acabou de dar sinal. O ônibus parou dentro do Terminal Metropolitano Cecap. A mulher, das latinhas, cheira a lixo, cigarro e outros odores e usa uma sombra lilás em suas pálpebras superiores. Uma jovem, com uma borboleta tatuada sobre seu pulso direito, esbarrou no rapaz do lanche e me fez ver que este aparou recentemente os pelos de suas axilas. À minha esquerda contemplo, neste breve momento, o Hotel Marriott. A leitora, sentada ao meu lado, tem uma bolsa do Mickey Mouse. Agora começou a chover. O rapaz, do lanche, descerá no próximo ponto, e penso, para me distrair, como seria se eu estivesse no ponto de ser o seu McLanche Feliz. Um ônibus, 732 – Jardim Angélica, acabou de ultrapassar o ônibus no qual me encontro. Mais dois 732 ultrapassaram o 731. Passo, neste instante, em frente a uma academia no Jardim Cumbica, e lembro-me, não sei por que, de um jovem que morreu afogado em um lago. A chuva está engrossando mais e mais, mas aparenta ser passageira. A mulher, proprietária das latinhas, bebe mais água e resmunga alguma coisa consigo mesma. O cheiro do vômito me incomoda. O ônibus parou e uma moça acabou de entrar com um bebê. Por hora ficaremos parados até alguém ceder-lhe lugar. Eu poderia, tranquilamente, oferecer-lhe o banco no qual estou sentado, mas me encontro no fundo, bem no fundo. Uma mulher pediu licença a uma outra mulher que a olhou com antipatia. Metade dos passageiros usam fones de ouvido. Apesar da distração, recordo-me agora do meu fracasso na prova de Ciência Política e sei que preciso estudar, com maior dedicação, os contratualistas. Hoje é aniversário do meu cunhado. Semana passada discutimos o conceito de vandalismo e a função social dos presídios. Ele é um bom operário. Mas pensa como seu patrão. Ensinei-lhe a função do banco de horas, mas ainda não aprendeu a lição. Sem querer, cochilei um pouco, e quando acordei o ônibus já estava meio esvaziado. A mulher das latinhas continua resmungando, mas já me acostumei com seu monólogo arrastado. Uma mulher acabou de descer pela porta da frente e o cobrador, mesmo recebendo sua passagem, não girou a catraca inocente. A proprietária das latinhas acabou de me cutucar e pedir um trocado. Confessou-me que ainda não havia almoçado. Dei-lhe uma moeda de um real. Quanto vale um prato de comida nessa vida? Daqui a três pontos será a minha descida. Lá fora, agora, cai uma rala garoa. Lembro-me de Sampa, do Caetano, e com certeza descerei do ônibus cantando. 

sábado, 11 de janeiro de 2014

UM HISTÓRIA PERFUMADA


"Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la

E comer um fruto é saber-lhe o sentido."

(Fernando Pessoa)


A casa estava cheirosa. Ela estava cheirosa. E eu também. Parece simples falar de perfumes, mas não é tão simples assim. Até então eu não sabia, mas o cheiro tem lá suas complexidades, suas patologias.
– Minha casa cheira a quê? – perguntou-me ela, como se não soubesse, e na verdade ela não sabia.
– Tem cheiro de aquário – respondi, sem muito pensar, e sem muito pensar lembrei-me do guardador de rebanhos.
Ela sorriu. Eu também.
– Aquário. Aquário. E aquário, cheira a quê?
Nesse momento sentamo-nos sobre sua cama, e, fazendo carinho em seus cabelos loiros, respondi:
– Aquário tem cheiro de vida, eu acho. Você sabe, aquário é um mar bem pequenininho, que cabe dentro de casa: cheira à beleza envidraçada.
O mistério em si eu só viria a descobrir um pouco mais tarde, quando a água da fonte já tivesse nos transbordado, isto é, após mergulharmos uma na outra, e não restar, de nós, nada mais que dois corpos molhados sobre a cama atirados. Naquela noite ela parecia a Vênus, do Botticelli, mas flutuando sobre mim.
– Você tem cheiro de aquário ­– disse-me ela, e percebi como a Vênus seria ainda mais linda se o Botticelli lhe pintasse um sorriso em seus lábios.
­– E você cheira a livros do Milton Santos – respondi, também rindo.
– Sou anósmica – confessou-me de uma vez –, não tenho olfato, mas, sendo você geógrafa, acho que tais livros também cheiram à aquário.
“Amanhã, quando eu chegar em casa, desenharei a Vênus sorrindo, saindo de dentro de um aquário” – pensei.

domingo, 5 de janeiro de 2014

ESPELHO, ESPELHO MEU


E em frente ao espelho você se pergunta:
Quem é este que está chorando?
E por que soluça assim?
E por que amanheceu cantando “Chão de Giz”?
E por que chora ainda mais ao ouvir “Capitão Gancho"?
E esse olhar irremediável de quem carrega uma perda irreparável?
E as brincadeiras de criança?
E esses fios brancos denunciando certa idade?
E os livros na estante?
E os sonhos frustrados, onde pararam?
E cadê o ânimo de quem ia beber todas e recitar Brecht em espanhol?
E o sorriso?
E o Caio? E a Clarice? E o José, o Carlos e o Mario?
E Sinha, Ju, Mami, Jhone, Lelê, Mayara e companhia?
E Bia, Babí, Lane, Mima, Déah, Dedê, Alana e Pri?
E a Ci, a Lisa, a Thau, Cátia, Mariana e Carlinha?
E o Antonio, a Mercia, Glória, Lucia, Henrique, Silvio, Valéria e Javier?
E o Diego e o Douglas e o Rafa?
E o mingau de aveia?
E Kid Abelha?
E as mensagens de felicitações?
E o sangue correndo nas veias?
E o mundo? E a classe? E a luta e seu curso?
E o resultado do concurso?
E...?
E as lágrimas secaram por si mesmas,
Mas passará o dia inteiro chorando por dentro,
E, no entanto, está feliz.