Dedico este texto à Rita Cássia Cardoso Pina, pela sua ousadia e audácia
diante dos alienados.
Em memória de Paulo Freire, aquele que jamais se silenciara diante da
opressão.
“Já foi dito que palavras são mortais. Eu diria que palavras são
incertas, mas as certeiras podem ser fatais.” (Marcelo Melo Soriano)
“O teu silêncio é um leque – um
leque fechado, um leque que aberto seria tão belo, tão belo.” (Fernando Pessoa)
Você já chegou a ponderar o fato dos mortos não falarem? É
sério, esta questão tem me intrigado muito, e confesso que até me parece banal,
mas não é! Pensando a respeito disso, depois de eu ter feito a faculdade, na
qual estudo, de laboratório, ou, em outras palavras, depois de eu ter feito uma
pequena análise sobre esse tema, utilizando, para isso, cobaias laranjas,
cheguei à conclusão de que morrer é calar-se. Disto você não duvidava, verdade?
Nem eu. Entretanto o ápice da minha “pesquisa de campo” se resume em comprovar
que o inverso, ou seja, calar-se enquanto se está vivo, é apenas um ensaio para
aquilo que, inevitavelmente, nos espera em algum ponto do tempo.
Assim como morrer é calar-se, do mesmo modo calar-se é
morrer. E o que me parece mais triste, na vida, é isso: viver a própria morte.
O grande objetivo do opressor, além de alienar os seus alvos,
é calá-los, até porque a opressão se abrevia a isso: SILÊNCIO.
Portanto, não se cale, por nada nem ninguém, afinal a nossa
estadia por aqui é imprevisível e curta demais para nos permitir tal
desperdício vocálico. No entanto, não fale tudo o que você pensa, falo isso
porque se fôssemos dizer tudo o que desejamos, certamente iríamos passar uma
temporada de férias na cadeia, ou em um sanatório – neste último caso até que
poderia ser uma experiência enriquecedora, visto que estaríamos em contato com
pessoas verdadeiramente normais.
Acredito que a reflexão-crítica, por parte do oprimido, voltado
ao seu problema, constitui o primeiro passo rumo à liberdade; o segundo passo,
em minha opinião, talvez seja a exteriorização dessa análise, o que pode ser
feita por meio da escrita, do desenho, da linguagem corporal ou verbal, mas em
todos esses casos a palavra ocupa o papel primordial diante da libertação do
sujeito; não cogitei, o bastante, o que poderia ser a terceira etapa contra a
opressão, porém atrevo-me a dizer que a união dessas pessoas, constituindo,
desse modo, um só grupo, o grupo opresso, juntamente com a coragem e a ousadia,
constituem a chave que lhes tiram do poder do opressor.
Mais uma vez reforço a importância de não se calar: mesmo que
você seja visto como o crítico-negativista-prepotente, fale! Fale sempre. Não venda
a sua voz por nada, muito menos por um trabalho medíocre, um programa de
caráter filantrópico, um artigo científico publicado em seu nome, balinhas, ou qualquer outra coisa que tenha a intenção de lhe silenciar. No capítulo 18,
versículos 9 e 10, Atos dos apóstolos diz: “não temas, mas fala, e não te
cales; porque Eu sou contigo, e ninguém lançará mão de ti para te fazer mal.”
Por fim, cito uma frase de Renato Russo, encontrada na letra
de “Aloha”, a qual sintetiza o que senti diante da análise acadêmica que fiz: “meus
amigos parecem ter medo de quem fala o que sentiu, de quem pensa diferente, nos
querem todos iguais, assim é bem mais fácil nos controlar, e mentir, mentir,
mentir...”.