sexta-feira, 21 de março de 2014

NÃO CONTE A NINGUÉM


PRIMEIRO ATO
Entra o leão com um cigarro na mão.
Enquanto fuma, vigia sua preza,
Deitada numa cadeira.
“Decifra-me ou eu te devoro”,
Ruge a fera, com leveza,
E acorda a ovelha.

SEGUNDO ATO
A ovelha cai no buraco.
Entra no ressinto do leão.
Quer, a todo custo, decifrá-lo,
Mas seu ato é vão,
Por hora, é falho.

TERCEIRO ATO
A tragédia está consumada:
Pelo leão, a ovelha está apaixonada.
Nega, pela imagem do sagrado,
Seu desejo irrefreável.
E sua prole?
E o Contrato?
A ovelha tresmalhou-se do rebanho.
Sente que o que sente é amor.
Está perdida e deseja ser salva.
Mas não pode alcançá-la o Bom Pastor.

QUARTO ATO
O silêncio consome a ovelha:
Ninguém pode saber da brincadeira.
Fala, pra si mesma, que só uma fase;
Vai passar, vai passar...
Ora, já não tem mais idade!
Já não tem mais idade de se apaixonar.

QUINTO ATO
A ovelha está completamente em desespero:
Agarrou-se ao próprio medo.
Atribulada, grita:
“Devora-me ou eu te decifro!”
O leão sorri.
É um homem,
Não um bicho.
O homem beija a ovelha,
Que se transforma em princesa.
Eis, pois, a esfinge decifrada.
As cortinas se fecham.
A plateia aplaude.
E o resto, é nada.