Olá...
Meu nome é Edvaldo dos Reis, tenho 21 anos, moro na cidade de
Guarulhos – SP, sou formado em Pedagogia e atualmente curso Ciências Sociais.
O motivo que me levou a escrever este e-mail encontra-se ligado diretamente a um artigo de sua autoria, intitulado
“Uma visão integrada”, publicado no mês de junho na Folha Humanitária (junho
2013, ano III, nº 26).
Bem..., poderia discutir mais a respeito de todo o corpo do
artigo, mas minha análise restringirá apenas à questão da educação,
especificamente a questão do que na Pedagogia chamamos de “Os Quatro Pilares da
Educação”.
Vou ser bem conciso: no artigo em pauta você afirma o
seguinte:
“(...) É necessário formar indivíduos criativos, inovadores, polivalentes1, com
capacidade de trabalhar em equipe, resolver
problemas2, na qual se aprende a
fazer3, aprende-se a ser4
e aprende-se a aprender5”
(p. 10).
Polivalentes1:
eu não sei se você
sabe, penso que não, mas quando se fala em formar indivíduos polivalentes, no
bojo deste discurso, aparentemente inovador e progressivista, encontra-se
inserida a ideologia da classe dominante, neste caso, a burguesia, que deseja
ver os filhos do proletariado (de)formados de modo que atenda às necessidades
do mercado, isto é, invés de possuírem uma formação sólida e específica (ex.
ser um médico, um advogado, um administrador, um cientista social, um filósofo,
ou qualquer outra profissão/formação), essa ideologia pretende que a classe
trabalhadora esteja “aberta a tudo”, ou seja, “domine tudo”, porque a
“faxineira” pode fazer a função dela e a do pedreiro e quiçá também a da
cozinheira. Espero que eu tenha sido claro: (de)formar indivíduos polivalentes
é prepará-los para atender os ditames do mercado, e não para se apropriarem da
riqueza acumulada historicamente, que é o conhecimento. Caso discorde, sugiro
que seja você mesmo um polivalente, isto é, abandone o que sabe acerca das
especificidades da Saúde Pública (já que você é um especialista nesta área) e desempenhe
outras funções: limpe o piso do hospital, recepcione os enfermos e faça também
curativos.
Resolver problemas2:
no que diz respeito
à habilidade dos indivíduos “resolverem problemas”, o seu texto não esclareceu
quais possíveis problemas são estes, ou, dito de outra forma, pergunto:
resolver os problemas de QUEM? Do dono da fábrica para quem eles provavelmente
vão vender a sua força de trabalho? Resolver problemas sociais? Problemas de
sua comunidade? Ora, a maneira como a questão foi colocada me parece que
dispensa a função de outros profissionais, chegando inclusive ser dispensável o
papel do Estado em resolver os problemas sociais, uma vez que está depositando no
indivíduo a responsabilidade dele (e exclusivamente ele) “resolver problemas”.
Aprende a fazer3, aprende-se a ser4 e aprende-se
a aprender5: no que toca a esses três “pilares”, tenho duas
posições: a primeira envolve o “aprender a fazer” e o “aprender a aprender”,
pois, segundo Saviani (2003) o “aprender a fazer” encontra-se totalmente atrelado
à educação tecnicista vinculada pela concepção escolanovista, a qual, como se
sabe, foi um “desastre” na educação brasileira, cujo discurso, apesar de apresentar
um ideal progressista, encontra-se pautado no intento de formar “apertadores de
parafusos” (tecnicismo), desvinculando de sua formação a necessidade de
disciplinas voltadas para a área de humanas (filosofia, sociologia, história);
o “aprender a aprender”, por sua vez, segundo Arce (2001) e Duarte (2001), encontra-se
respaldo no discurso pós-moderno e na proposta neoliberal, “matando” a função
social do professor (que é o ensinar), apregoando o fim da transmissão do
conhecimento e “McDonaldizando” a escola, tudo isso com o intento maior de transformar
a educação em mercadoria (o que já é uma realidade); a minha segunda posição
diz respeito ao “aprender a ser”, pois nunca me debrucei especificamente sobre
este “pilar”, por não ter encontrado material que o analise de forma radical
(no sentido marxista, isto é, indo na raiz do mesmo), no entanto, ouso
perguntar: aprender a ser o quê? Aprender a ser quem? Com base em qual fundamentação
teórica ou em qual “espelho”? Aprender a ser um pequeno burguês? Aprender a ser
um proletário obediente e conformado em vender a sua força de trabalho? Aprender
a ser um alienado que não tem consciência da riqueza que ele mesmo produz? Que
aprender a ser é este? Bem..., como nunca me debrucei sobre essa questão antes,
como disse anteriormente, deixo aqui essas questões para repensarmos este suposto
“aprender a ser”.
Espero que não me interprete mal e que entenda as minhas
análises; sim, é claro que a educação deve levar em consideração a
“comunicação” e a “informação”, mas de modo algum deve pautar-se apenas e
exclusivamente nisto.
Finalizo com uma citação de um dos maiores críticos do
capitalismo: “Conclamar as pessoas a
acabarem com as ilusões acerca de uma situação é conclamá-las a acabarem com
uma situação que precisa de ilusões. A crítica não retira das cadeias as flores
ilusórias para que o homem suporte as sombrias e nuas cadeias, mas sim para que
se liberte delas e brotem flores vivas” (Karl Marx).
Atenciosamente, Edvaldo dos Reis.
Guarulhos – SP, 30 de junho de 2013.
REFERÊNCIAS:
ARCE, Alessandra. Compre o kit
neoliberal para a Educação Infantil e ganhe grátis os dez passos para se tornar
um professor reflexivo. Educ. Soc., Campinas, v. 22, n. 74, p. 251-283,
abr. 2001.
DUARTE, Newton. Vigotski e o
“aprender a aprender”: crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas
da teoria vigotskiana. 2 ed. Campinas: Autores Associados, 2001.
SAVIANI, Dermeval. Escola e
democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre a
educação política. 36 ed. Campinas: Autores Associados, 2003.