Hoje à tarde, Julia esteve aqui em casa – na verdade, Ju vem
aqui quase toda hora –, e, como sempre, pegou uma folha de caderno que estava
em cima da minha escrivaninha e começou a desenhar. Como eu sei que a sua mãe está
lhe ensinando a família silábica do b,
eu, mexendo no computador, falei, brincando:
– Ju, como é b com a?
Ela, rapidamente, respondeu:
– Ba!
Beleza, até aí tudo bem, afinal ela “memorizou” (como diria
os construtivistas de plantão) a família do b.
No entanto, resolvi desafiá-la um pouco mais:
– E t com u?
Sem muito pensar, ela falou:
– Tu.
Achei intrigante o despertar de sua consciência fonêmica, e as
respostas dela me deram tanta euforia que resolvi bolar uma atividade em cima
da hora, sem muito planejar.
Levantei-me da cama, peguei uma folha de sulfite, dei-lhe um
lápis de escrever e pedi que se sentasse na cama para fazermos uma atividade.
De pouco em pouco, comecei a digitar palavras no meu computador, palavras de
conversão grafofonológica simples, admito, mas desafiantes para sua idade.
A primeira palavra foi boi. Embora tal palavra seja um monossílabo, resolvi separar suas letras, de modo que a mesma, após ser fragmentada, ficou assim: bo i. Não foi muito difícil lê-la, na verdade, foi
até fácil, porque ela quase que leu sozinha, e isso por meio da
decodificação (soletração).
Após ler (e não adivinhar) a palavra boi, pedi que a copiasse na folha de sulfite que lhe dei, e isso ela
fez com maestria (risos). E assim se deu boa parte da atividade. Contudo, nas
últimas três palavras do ditado, pedi que ela própria as digitasse no
computador, letra por letra, sílaba por sílaba, até porque não vejo nada de mecânico
nisto.
A atividade foi um sucesso, pois conseguir alcançar o objetivo
principal que pretendia: descobrir se as instruções fônicas que estamos lhe
dando estão surtindo bons resultados.
Percebi que, aos poucos, Julhinha está adquirindo o princípio
alfabético, pelo menos está começando a conseguir fazer relação grafema-fonema,
embora ainda rudimentar, mas que é normal para uma criança de quatro anos de
idade.
Com esta atividade também detectei um problema: os fonemas p, b,
t e d são muito parecidos entre
si, no que diz respeito à articulação, e isso a confundiu bastante, porém
chamei a sua atenção para cada um deles, enfatizando os sons de cada um e
juntando-os com todas as vogais.
Ao final, ela perguntou-me se podia desenhar no restante da
folha, e como a atividade era sua, respondi-lhe que sim, que podia fazer o que
quisesse com ela.
Quero deixar registrado aqui mais um fato que não é novo, porém,
em tempos em que não se sabe distinguir construtivismo
de pós-modernismo, é mais do que
válido lembrar: a escrita é um objeto social, e, como tal, possui suas regras e
convenções; sua aprendizagem requer instrução e explicitação, e, como diz Klein
(2012),
o contato da criança e sua ação
sobre os símbolos da escrita, ainda que esses símbolos estejam organizados
correta e significativamente como linguagem, não garantem, por si sós, que a
criança aprenda a linguagem escrita. Isto porque, nesta circunstância, o
aprendiz estará diante de um punhado de “coisas” que não configuram a linguagem
escrita. É preciso que haja homens utilizando de forma real essa linguagem,
para que ela se configure enquanto tal (Op.
cit., 2012, p. 109).
Que as pessoas jamais se esqueçam disto!
Abaixo encontram-se anexadas algumas fotos que tirei durante a atividade:
(Odeio modismos,
ainda mais os "pós-modernos", no entanto ela insistiu que queria o "coraçãozinho", mas já estou cogitando a possibilidade de "letrá-la", a
partir, no entanto, da dialética marxista)
REFERÊNCIA:
KLEIN, Lídia Regina. Alfabetização: quem tem medo de ensinar?. 6 ed. São Paulo: Cortez, 2012.
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