sábado, 28 de novembro de 2015

A MUDEZ HEREDITÁRIA


Eram palavras,
Vozes e sons,
Todos harmônicos,
Em relativa cumplicidade.
Mas então veio a crise,
A descoberta,
A saída do armário.
E junto com ela
Vieram os gritos,
O turbilhão de vozes,
O Vozerio,
A algazarra,
As agressões,
Físicas e morais.
Os agudos agravaram-se.
Os graves agudizaram-se.
Com o tempo
A feira de insultos deu lugar ao silêncio.
As palavras se calaram.
Prenderam-se no fundo da garganta,
No calabouço da alma.
As vozes foram abaixando,
Perdendo sua potência vocálica,
Até alcançar o completo silêncio,
A mudez hereditária,
Tanto do pai quanto do filho.
Aí veio a morte,
A morte da palavra,
E com ela a negação de ser humano.